quarta-feira, 8 de junho de 2011

Pais do coração ligados pelo DNA da alma



O ENAPA reuniu cerca de 700 interessados em questões concernentes a adoção de criança e adolescentes
Celina Soares


Os fundadores do Monaci, Alberto e Aristéia Rau, participaram
do ENAPA
No dia 25 de maio é comemorado o dia nacional da adoção no Brasil. Há dezesseis anos diversos grupos reúnem-se nessa época para pleitear melhorias e trocar experiências sobre a adoção de crianças e adolescentes no Encontro Nacional de Apoio à Adoção(ENAPA). Neste ano, o evento foi sediado em Curitiba - PR nos dias 2,3 e 4 de maio com a temática central: “Adoções e suas histórias”.
O público do ENAPA foi composto por juízes da vara da infância e juventude; mães,pais e familiares de filhos adotivos; pessoas da sociedade civil ;voluntários entre outros. Segundo a Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR), um dos responsáveis pela organização do ENAPA, o evento recebeu cerca de 700 inscrições de diversos estados brasileiros.
O promotor de justiça Sávio Bittencourt , fundador do
Quintal da casa de Ana, ex-presidente da ANGAAD (Associação Nacional dos grupos de apoio à adoção) abriu a primeira das vinte e seis palestras do com o mote: “História da criança: do nascimento até a conquista da família”. Bittencourt reside no estado do Rio de Janeiro, é pai adotivo e enfatiza que as crianças abrigadas vivem em uma cultura baseada no medo: medo de mudança e medo de que as coisas também não mudem.
O promotor destacou sobre a importância da reintegração familiar considerando que a adoção não é a última possibilidade; criticou a adoção de crianças idealizadas pelos futuros pais (estipulam características físicas e a idade) e defendeu a necessidade da diminuição do tempo de permanência delas em abrigos que, segundo a nova lei de adoção (sancionada pelo ex-presidente Lula em 03 de agosto de 2009) é de 2 anos.
Sávio adverte que o judiciário precisa conhecer o que é essa situação de perto, aprender sobre empatia e realmente se colocar no lugar dessas crianças “ Vamos fazer uma campanha : abrigue o seu filho por um dia ou fique em um abrigo por seis meses”, declara o promotor.
Em 2005, o fundo das Nações Unidas para a infância (UNICEF) divulgou que o Brasil ocupava a nona posição entre os países com o maior número de órfãos do mundo, uma estimativa de 3,7 milhões.
O presidente da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional de Alagoas (CEJAI- AL) Ivan Vasconcelos Brito Júnior afirma que os juízes da infância devem julgar os casos, com mais sensibilidade do que normalmente utilizariam em outros juizados, lembrando sempre do melhor interesse da criança e do adolescente. “Teve um caso de um adotando de 12 anos que preferiu continuar no abrigo, ele já havia passado o período de estágio de 30 dias com o casal francês de adotantes e no último momento decidiu não ir”, exemplifica Vasconcelos.
A presidente da ANGAAD Maria Bárbara Toledo ministrou palestra sobre A Influência dos ENAPAs na Justiça e na sociedade. Bárbara conta que está compromissada com a divulgação da nova cultura da adoção, pois pretende despertar os corações da sociedade e poderes constituídos brasileiros (executivo, legislativo e judiciário).
“ Por que não falar de adoção¿¿ Precisamos ter orgulho da nossa história, são histórias de amor, de submissão, histórias de amor incondicional de mães e pais do coração”.
A empresária Clarisse Galvão Palma Coelho e o esposo César Nogueira Coelho são pais da adolescente Helena Galvão Palma Coelho. Clarisse concorda que as famílias precisam ter orgulho de suas histórias e passar isso para os filhos, “ É um crime não contar para a criança a história dela.Nós somos frutos do que vivemos seja algo bom ou ruim, certo ou errado. Quando Helena era pequena, ela chorava e pedia para que eu dissesse que ela havia saído da minha barriga e eu lhe respondia que a mãe dela a carregou na barriga por 9 meses,mas, eu seria mãe dela pela vida inteira e por toda minha existência”, disse a empresária.
 Clarisse e sua filha Helena
Segundo o magistrado Ivan Vasconcelos a vergonha de possuir filhos adotivos ou ser adotado, no Brasil, ainda é um reflexo arrastado da época dos coronéis. Os coronéis apadrinhavam os próprios filhos bastardos (fora do casamento) e as mães guardavam o segredo da identidade biológica paterna.
Para a juíza Maria Isabel de Matos Rocha do Mato Grosso do Sul a adoção deve ser realizada apenas pelo afeto, deixando de lado a bandeira do altruísmo e outros interesses tais como: a solidão ou a esperança de salvar um casamento. Durante a exposição sobre Histórias de adoções mal sucedidas (devoluções) a juíza citou um trecho do livro Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry, “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” e compartilhou de situações que, os candidatos a adotantes não lembravam nem mesmo do nome do adotando.
Rocha apontou a carência de políticas públicas efetivas que tratem das questões familiares com um todo, tais como: planejamento familiar, ações educativas voltadas para os responsáveis que possuam vínculos biológicos com as crianças e adolescentes visando consolidar a reintegração familiar.
O juiz da Vara da Infância e Juventude de Cascavel – PR Sérgio Luiz Kreuz discursou sobre Histórias da adoção ilegal ou clandestina e sua regularização. O juiz mencionou os dois tipos de adoção existente do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a bilateral (pais sedem direito ao casal) e unilateral (formulada pelos parentes ou responsáveis que possuem a tutela da criança).
Kreuz considerou primordial o apoio e o acolhimento das mães que decidem entregar voluntariamente os seus filhos para adoção, sem serem excluídas ou julgadas moralmente pela sociedade. “Desde a gestação muitas já não querem a criança o que resulta em bebês jogados em lixões. A entrega voluntária é um ato de amor, se a mãe sente que não tem condições ou tem outras prioridades, que entregue para outra família”, relata o juiz.
A entrega voluntária deve ser feita sem má fé, subtração ou promessa de pagamento, explica o juiz, “Já conheci casos que a mãe vendeu o filho que ainda estava na barriga e se arrependeu, depois de entregá-lo para o casal. Com a nova lei de adoção a criança saberá que foi comprada e que a vara da infância e juventude jamais compactou com essa situação por que no futuro o prejuízo é da criança que poderá sofrer chantagens da mãe biológica e viverá insegura e atemorizada”.
Luiz Eduardo Barcellos de Abreu ou Lula como é conhecido, integra a coordenadoria do Grupo de Apoio Rosa da Adoção do Rio de Janeiro. Ele é casado com Viviane Giorno Barcellos de Abreu e pai adotivo de Luana e Luiz Vitor.
Lula veio de uma família numerosa e sempre sonhou com a paternidade, porém descobriu que ele e sua esposa eram estéreis. A ideia da adoção já existia, mas, a notícia fortaleceu o desejo levando-o a comentar sobre esse sonho com todos que o conheciam, até que no dia 02 de janeiro de 2002 recebeu uma ligação da Bahia de sua boadrasta ( como ele a denomina) Salete Eugênia de Souza contando que uma das vizinhas havia encontrado um bebê na porta de casa.
Luiz disse que por ele pegaria um vôo imediatamente do Rio de Janeiro para Bahia, mas, não foi possível devido a um temporal. No dia 03 de janeiro, lá estava ele e Viviane na Bahia com filmadora e câmera fotográfica.
A criança foi deixada na porta da casa de uma diretora que também não possuía condições para acolher a menina. Lula relata “A mãe deixou uma carta contendo informações sobre o dia que a Luana nasceu e os motivos os quais ela a deixou. Eu e minha esposa levamos minha filha no pediatra, contratamos um advogado para realizar o pedido de adoção no juizado, passamos pela avaliação da assistente social e em setembro de 2002 fomos habilitados”.
Em maio de 2003, o casal Barcellos resolveu adotar mais uma criança, o Luiz Vitor. O garoto estava com tuberculose, escabiose, sífilis e suspeita de ser soropositivo, mas, nada disso diminuiu o interesse dos adotantes. “ O amor tudo cura, pois a família tem o DNA da Alma”, declara o papai feliz demonstrando (em seguida) um sms que a filha Luana enviou no celular dele, dizendo que está com saudades.
As histórias dos personagens mudam, as cidades e os países,mas, a matéria bruta é a mesma o “amor”, amor incondicional que os estimulam pessoas estreitarem laços afetivos e consolidá-los por meio da adoção. Histórias de pessoas que não se importam com o sexo, idade ou raça dos adotandos, almejam com todo o vigor de sua essência ter uma família, pois, sonham acordadas e até mesmo dormindo com os abraços de suas crianças.

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4 comentários:

  1. Cara Celina:
    Estive no ENAPA e posso dizer que muitas coisas me marcaram do início ao fim. Sou mãe por adoção, mas nunca havia participado de grupos de adoção.
    Vim a me interessar em ajudar pais que querem adotar, através da história do casal Aristéia e Alberto do MONACI. Sempre me comovo com as crianças em instituições. E me revolto com a postura do Poder Judiciário de Curitiba que não conhece todas as crianças e adolescentes institucionalizados. Nunca consegui compreender o porquê de um recém nascido ir para uma instituição e demorar mais de dois anos para se efetivar a adoção.
    Portanto, muito me surpreendi com o maravilhoso discurso de nossa Juíza da 2ª Vara. A qual falou em “permitir que cada criança descubra a estrela que existe nela”, enfatizou a realidade injusta e a importância em fazer uma criança feliz. A Juíza quase me emocionou com seu jargão: ABSOLUTA PRIORIDADE, A CRIANÇA NÃO PODE ESPERAR. Que palavras comoventes, se nós não conhecêssemos a realidade da lentidão das adoções em Curitiba. A Juíza relatou que os casais candidatos a adoção querem uma criança de conto de fadas. Me senti agredida e com certeza a grande maioria de pais adotivos ao escutar que desejamos “Barbes”. Passei a acreditar que ela não conhece nem as crianças institucionalizadas e nem os casais candidatos a adoção. A Juíza discursou que o ENAPA seria uma oportunidade de reflexões positivas. Assim esperamos realmente tenha sido.
    Exemplos positivos como o do experiente e humano Juíz Sérgio Luiz Kreuz, de Cascavel, devem ser difundidos. O Juíz relatou buscar o interesse da criança e não do adulto. No caso da criança institucionalizada, verificasse os laços afetivos desta com a família de origem, se estes laços não existem a destituição deve ser feita e a criança terá o direito de ter afeto de uma família adotiva. “Imploro para que sejam ouvidas as crianças institucionalizadas” enfatizou Kreuz, ao se intitular apaixonado por adoção.
    Espero que através do ENAPA, o Poder Judiciário tenha tomado conhecimento de como utilizar a “nova lei de adoção” para o bem da criança tornando a adoção mais ágil. Dizem que todos os casais querem bebês, portanto um recém nascido não deveria ficar institucionalizado. Como disse o promotor Sávio Silva: “As crianças não deveriam ter que passar nem um dia numa instituição, vamos abrigar os Juízes”.
    Se os Juízes se sentem inseguros para efetivar uma adoção, devem se cercar de profissionais que lhes dêem esta certeza. A infância passa muito rápido, cada dia é importante para um ser em desenvolvimento. As crianças não podem pagar pela inoperância de quem tem o poder de decisão. Ou pior, a vida familiar estar impedida de acontecer, pela soberba de quem não faz o seu serviço e não admite que ninguém lute para que os prazos sejam compridos. Os juízes têm que se capacitar para tirar as crianças dos abrigos. Deve ser um orgulho para um Juíz saber que em sua comarca TUDO é feito para que as crianças não cresçam nas instituições.
    Muito teria, ainda, para escrever sobre as impressões de uma leiga iniciante no ENAPA. Mas o que mais me impressionou foi a sinceridade e o brilho no olhar dos voluntários desta causa, quem se empenha é porque ama a vida e almeja que esta possa fluir em sua plenitude. Então, desejo que o brilho e a motivação amorosa destes lutadores reflitam na alma das equipes técnicas e de todos os envolvidos na decisão de tantas vidas. Que todas estas reflexões positivas, vividas nestes três dias de ENAPA, contribuam para que as palavras não se tornem um discurso retórico e a ação aconteça em prol da prioridade absoluta. Pois os adultos podem, mas as crianças não podem esperar!
    Ana Paula Maddalozzo

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  2. Olá, amiga Celina.
    São pessoas como você, que se importam com os semelhantes, que fazem toda a diferença na nossa luta em prol de libertarmos as crianças abrigadas e dar-lhes um lar com muito amor e carinho!
    Que os juízes e as equipes técnicas de nosso Brasil leiam esse trabalho tão lindo e se sensibilizem com essa causa que é de todos nós!
    Adorei te conhecer, querida!
    Que você continue nos ajudando sempre!
    Um abraço muito fraterno...Clarisse Galvão Palma Coelho - ENAPA DE CURITIBA - 2011.

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  3. Boa tarde, Ana Paula!
    Foi meu primeiro ENAPA e espero que esse evento seja um estopim para a discussão dos diversos assuntos que envolvem a adoção. O evento foi um grande aprendizado!
    Ouvi inúmeras histórias de voluntários e pais adotantes e compreendi o que é de amor incondicional.
    Realmente, existem muitos assuntos para serem discutidos um deles é a reintegração familiar de menores, pois, acompanhamos na mídia inúmeros casos em que os pais biológicos acabam desassistindo os filhos novamente. Enfim, cada caso é um caso.
    Espero mudanças com a nova lei de adoção, pois conhecemos inúmeros adotandos que passaram a infância à espera de uma família.

    Atenciosamente,
    Celina Soares

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  4. Olá, querida Clarisse!
    Foi muito importante ter ouvido a sua história, ter entendido o seu coração e chorado com você.
    A sociedade precisa conhecer os vários prismas que envolvem a adoção. Histórias de amor incondicional(insisto em destacar isso) iguais à sua e da Helena, da família do Lula, da Aristéia e de tantas outras pessoas que sonham em formar família.

    Obrigada, obrigada, obrigada.

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