"A opressão nunca conseguiu suprimir nas pessoas o desejo de viver em liberdade" (Dalai Lama)
No dia 22 de março do presente ano o MONACI publicou matéria sobre a ação dos inadotáveis em que noticiava a revelia do Estado do Paraná, conforme se vê neste link.
Nos equivocamos.
A 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, em sua alteração de localidade, suspendeu todos os prazos processuais até se reorganizar, o que terminou por elastecer o prazo do Estado para resposta.
O Estado contestou, e o que veio como resposta é um disparate tão grande e tão assombroso que publicaremos, por partes, para que se torne ainda mais escancarado aos olhos do público o caráter institucionalizado do preconceito, abandono e displicência direcionados ao menor abrigado.
A contestação do Estado do Paraná foi apresentada em 14 de abril de 2014, contém 48 laudas, possui 15 itens contestatórios e uma verdadeira torrente de distorções, inverdades e preconceitos.
Passamos a apresentar o seu conteúdo, retirando os nomes das partes envolvidas a fim de preservar a identidade dos indivíduos, bem como acrescentamos os grifos pertinentes.
Recapitulando os elementos do processo, lembramos que o Autor da demanda hoje é maior de idade, ficou de 2003 até 2014 na instituição de abrigamento APAV, nunca fora destituído do poder familiar nem mesmo foi colocado em fila de adoção ou inscrito no CNA.
A ação foi aforada em 17 de novembro de 2013, conforme publicamos no blog do MONACI à época. Postulamos indenização pelos danos morais sofridos pelo jovem, pois eram expressas e inequívocas as violações ao ECA e à Constituição da República, perpetradas pelo Estado, e que culminaram na perda permanente de possibilidade de adoção pelo jovem.
Para a nossa surpresa, entretanto, a contestação à ação apresentada pela Procuradoria do Estado do Paraná, em si, é tão preconceituosa que, por si só, gera danos morais!
Logo no começo da peça de defesa, assim se manifestou o Procurador do Estado:
"3.3.1 Nos autos do processo, há relatório da assistente social da Equipe Técnica da Xª Vara da Infância e Juventude que atesta que o SR. XXXXXXX (i) é portador do vírus HIV, (ii) apresenta quadros significativos de depressão, (iii) é criança de difícil convivência, (iv) é agressivo, (v) passa por tratamento psiquiátrico, (vi) tentou o suicídio duas vezes, (vii) não tem condição de sair do abrigamento na APAV." (grifos nossos).
O Estado, como sua defesa, começou por desqualificar o jovem por ser portador de vírus HIV e por estar em situação de extrema fragilidade emocional logo após ter sido trazido ao abrigo!!!
Não houve a sensibilidade para se identificar que foi justamente por estar sem condições que o jovem precisava ser submetido a especial cuidado e assistência, que precisava ter priorizada a sua reinserção dentro de uma família, que precisava de apoio e de afeto para superar a situação que lhe foi imposta por repetitivos abusos, que precisava, efetivamente, da materialização dos direitos garantidos na Lei.
Não houve a sensibilidade para se identificar que foi justamente por estar sem condições que o jovem precisava ser submetido a especial cuidado e assistência, que precisava ter priorizada a sua reinserção dentro de uma família, que precisava de apoio e de afeto para superar a situação que lhe foi imposta por repetitivos abusos, que precisava, efetivamente, da materialização dos direitos garantidos na Lei.
Além do mais, ser portador de HIV não é impeditivo para ser adotado, para ser destituído de uma família que lhe causava abusos das mais execráveis formas, para ser amado por uma mãe e um pai substitutos. Ser portador de HIV não faz do jovem um ser humano pior, de segunda classe, inferior, indigno, não merecedor de seus direitos fundamentais!!! Discriminar o jovem, na qualidade de ser humano, por ser portador de vírus HIV, viola o mais basilar dos Direitos Humanos!!! Envergonha todo o ordenamento jurídico pátrio, desconstrói todas as normas de proteção à Criança e à Juventude e vai de forma contrária às cláusulas gerais de não-retrocesso do direito!!!
Reiteramos: o jovem foi abrigado em 2003!!! Em 2005, no entanto, depois de o jovem ficar 2 anos recolhido em um abrigo tendo ignorados os seus direitos a destituição do poder familiar e inscrição em fila de adoção, para que pudesse ter a oportunidade de ser adotado, o juízo assim determinou em seu processo de abrigamento:
“(...) Estando Xxxx protegido na entidade que o acolhe e sem perspectiva de reintegração familiar, determino o arquivamento do feito.
Anote-se
Ciente o M. P.
Em 10.03.05
Xxxxx Xxxxxx Xxxxxx Xxxxxx
Juíza de Direito”
A Juíza do processo afirmou, categoricamente, que estava arquivado o feito, sem respeitar todos os direitos a que fazia jus a então criança...
CONTINUA!
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