quinta-feira, 14 de julho de 2011

O 21º aniversário do ECA foi marcado por Audiência Pública em São José dos Pinhais, pela aplicabilidade integral da Lei

Dra. Lidia Weber
Nesta quarta-feira (13), dia em que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), completa 21 anos, a prefeitura de são José dos Pinhais, através da secretaria de Assistência Social, e com participação das secretarias da Saúde, Educação, Segurança e Trabalho, apoiou Camara Municipal, na realização de audiência pública alusiva à data.

O presidente da Câmara e proponente da audiência, professor Assis, parabenizou os participantes pelo interesse num tema que segundo ele, é da maior relevância. Assis também compartilhou da visão dos palestrantes, inclusive da Dra. Lídia Weber da Universidade Federal do Paraná, autora de diversas publicações sobre o tema, de que o ECA demonstra ainda estar longe de ter autonomia em sua aplicabilidade.

Quando ainda estudava psicologia, na graduação, eu e alguma colegas decidimos fazer alguns trabalhos voluntários junto a uma instituição de abrigamento. Fomos num dia de vacinação e vi uma fila de crianças, que ao levar a picada da agulha, baixavam a cabeça e saiam chorando, sem ter para quem reclamar, ou contar com um afago, coisa que fazemos com nossos filhos”, conta Lídia, colocando essa história como o início de sua luta de mais de 20 anos, pela causa da adoção, desabrigamento e aplicação do ECA. “Foi a partir daí, que fomos até a Fundação de Ação Social (FAS) de Curitiba e resolvemos iniciar uma pesquisa para sabermos de quantos eram essa população e em que condições vivem”, completa. Ela lembra que na época, as assistentes sociais da FAS lhe disseram: “Não vai ser preciso, porque está para ser aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente e acreditamos que tudo isso vai ser contemplado”, recorda Weber, concluindo que infelizmente, o avanço foi mais no sentido da legislação, o que não significou a ação.

José Carlos Marinho,um dos palestrantes, é presidente do Grupo Romã, de Apoio à Adoção em São José dos Pinhais, e pai adotivo de duas meninas. Ele acredita que para solucionar o problema da demora, para que realmente aconteçam as adoções é preciso que se criem mais varas especializadas, da Infância e Adolescência e que do contrário, só fica no discurso. “'Já temos a legislação, agora precisamos que seja executada”, enfatiza Marinho.

Ingrid Jane Giraldi de Souza, pedagoga e diretora do Departamento de Promoção Humana da Secretaria de Assistência Social de São José dos Pinhais, disse que ouve muitas pessoas reclamarem do ECA, dizendo que agora as crianças têm muitos direitos e nem podem mais trabalhar. Ela considera esse argumento como desinformação e até mesmo uma visão equivocada do que seja respeitar os direitos da criança. “Muitos pais vêm os filhos como um objeto de sua posse e não como um sujeito de direito”, acrescenta.

Para a também palestrante no evento, Ana Christina Brito Lopes, mestre em Ciências Penais pela UCAM/RJ, doutoranda em Sociologia pela UFPR e Coordenadora do Observatório de Violências na Infância: “houve muitos avanços, mas para nosso desafio, grande parte deles apenas como lei, agora precisam aplicá-la”, afirma.
 Lídia Weber, Ana Christina Lopes, Prof. Assis,
Aristéia Moraes Rau e José Carlos Marinho
Outro apoiador do evento e da causa, o Movimento Nacional das Crianças “Inadotáveis” (MONACI), representado pela fundadora Aristéia Morais Rau, que é pretendente à adoção, e, ao procurar informações sobre a situação de crianças para serem adotadas, deparou-se com abrigos lotados de crianças com idade variando entre recém nascidos a 18 anos. Ela constatou que nem mesmo a destituição do poder familiar desses infantes e adolescentes têm sido feita de maneira efetiva, conforme determina o ECA, em seus artigo 19, que prevê a destituição do poder familiar, ou reintegração à família de origem, quando possível, em 120 dias, assim como o artigo 163, sobre o direito à convivência familiar, afirmando que: Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária”.

Nossa luta é pelo cumprimento do ECA. Essa lei é maravilhosa e para sua aprovação, em 1990, foi discutida nos quatro cantos do país. No dia de hoje, ao invés de comemorar, estamos aqui lutando para que ela seja aplicada, nas suas premissas mais fundamentais, sobretudo, no que diz respeito aos direitos humanos das nossas milhares de crianças abrigadas no Brasil”, destaca Aristéia.


A Audiência Pública, trouxe como tema o respeito aos direitos da criança e do adolescente, principalmente, daqueles em situação de maior vulnerabilidade, como é o caso das crianças com HIV. Segundo a Dra. Lídia Weber, nesses casos, além de discriminação sofrem com dificuldades burocráticas quando pessoas habilitadas pretendem adotá-las, por não serem consideradas como adotáveis, “conforme a prática demonstra”, enfatiza. Ela acrescenta que o perfil do adotante brasileiro vem mudando, abrindo inclusive para idade acima de 5 anos, grupos de irmãos e étnico-raciais, o que poderia ser um grande avanço, não fosse os entraves encontrados na aplicação da lei.

Os representantes do poder judiciário, tanto de São José dos Pinhais, como do Estado, não puderam se fazer presentes. Mas houve grande participação de representantes da sociedade, e muitos questionamentos foram levantados, o que confirma a dificuldade de entidades cuidadoras, como abrigos e escolas, em buscar respaldo na própria lei, quanto à aplicação do Estatuto. No Paraná, a estimativa não oficial, é de existam mais de cinco mil abrigados.

Desde a criação do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), apenas cerca de cinco mil crianças, da estimativa de mais de cem mil abrigadas no país, foram colocadas no CNA. Destas, até abril deste ano, 425 foram adotadas, por meio do cadastro, enquanto mais de 21 mil pretendentes habilitados estão aguardando na fila.

Outro dado preocupante é que, como a demora da destituição da tutela familiar é muito grande, o que permite entrar no CNA, quando ocorre, os abrigados já estão próximo de completar a idade adulta, e perto de 50% deixam de fazer parte do cadastro por esse motivo. Outra parcela nem chega a entrar, pois acabam completando os 18 anos, e saem dos abrigos sem ter para onde ir.

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